Há quem diga que no Brasil não existe preconceito de raça, que
é tudo uma questão social.
Já imaginaram um
diálogo, assim, bem sincero, entre alguém que quer alugar um apartamento e os
candidatos a inquilino, usando esse argumento?
“Frederico tinha
um apartamento para alugar nas quadras 300 do Plano Piloto, um dos locais mais
caros de Brasília. E marcou com um rapaz de ver o lugar. Mas o cara que chegou
era negro.
O Frederico já pensou logo: "Esse preto tem cara de pobre. Depois me atrasa o aluguel..."
Deram uma olhada
no apartamento, que era bom. Marcelo – o nome do rapaz negro – perguntou o
preço.
- Então, já está
alugado. – respondeu o Frederico, com um sorriso amarelo.
- Puxa, que
pena. Não sabia. Tudo bem. Vou ver outro lugar. – respondeu o Marcelo.”
Fim.
Mas peraí. Eu
falei que ia rolar um conversa com o argumento da questão social. Que tal reformulamos esse diálogo?
Mas antes que eu faça isso, já perceberam que eu não disse de qual raça era o Frederico?
Não precisa, né?
Você, meu caro leitor, já sabia que ele era branco, não é mesmo?
Se você leu até
aqui, você não é racista. Mas já parou
para pensar nisso? É automático. A nossa cabeça é colonizada. E nela um
homem branco é a regra. Os outros é
que são a exceção. Tá tão assustado quanto eu? Pois é...
Mas
continuando... Eu disse que ia reformular o diálogo, né? Usando o argumento de
que o racismo é uma questão social. Afinal, se isso é um bom argumento, todo
mundo devia usar isso no dia-a-dia, não?
Nesse caso,
seria assim:
“Frederico..." - vou dizer que ele é branco, estamos combinados? Afinal, ele podia ser de qualquer outra raça, só para lembrar...
Bom, recomeçando...
"Frederico,
um branco, queria alugar um apartamento nas 300. E o primeiro cara que apareceu
para alugar chamava-se Marcelo – e era negro.
Quando o Marcelo
quis saber o preço, o Frederico respondeu assim:
- Então,
Marcelo... - falou de forma simpática - Você é negro, não é mesmo?...
- É... Sou. E
daí?
- Justo. -
respondeu Frederico, entusiasmado – Você é jogador de futebol,
sambista?...
- Não...
Imagina! – respondeu Marcelo constrangido – Eu sou empresário, dono de uma
concessionária.
- Ah, tá... Não,
cara, ó, pode falar à vontade comigo. Eu entendo. Você morando na periferia,
tentando melhorar de vida...
- Eu moro no
Lago Sul, cara!
- Ah, tá... Lago
Sul... – disse Frederico, sem acreditar - Olha, os seus tataravôs vieram em
navios negreiros... Morria mais da metade na viagem, né?... Depois chegaram,
moraram em senzalas...
- Onde é que
você quer chegar com isso?
- ...e depois da
Abolição, foram morar longe, em favela, não tinha trabalho, não tinha
dinheiro... Então, você, empresário?... Morando no Lago Sul? Cara, uma
pessoa negra no Brasil... É uma questão social, histórica...
- Não tô entendo...
- Tá, eu sei que
você, lá na favela, foi mal alimentado, estudando em escola pública, muita greve
de professor... Vai ter dificuldade de entender uma situação histórica,
social... Mas eu vou explicar! Olha, veja você: um negro, no Brasil, empresário?...
Que carro você tem?
- Um Corolla. Tá
estacionado lá embaixo. Beeem caro, sabe? – disse Marcelo, já atravessado.
- Viu?! Um
Corolla... Não, não tá certo!!! Pelo IBGE, era no máximo pra você ter um carro usado, daquelas que tão meio caindo aos pedaços, sabe? Isso se você
não viesse de ônibus, que era o mais provável.
- Ah, jura? – o
sangue já subindo na cabeça do Marcelo.
- Cara...
Olha, o que é que adianta?... No mínimo, você tá querendo pagar algo
acima do que você pode. No máximo, você falsificou os documentos, e alugou
esse terno que você tá vestindo, não é verdade?
- Esse terno eu
comprei na Itália!!!
- Marcelinho,
Marcelinho... Você quer que eu acredite que você comprou isso no exterior? Olha
como tá mal cortado!... Vai dizer que você não comprou na Feira do Rolo da
Ceilândia?...
- Cara, eu ia
até pagar adiantado... Não to acreditando no que eu tô ouvindo...
- Olha, vamos
fazer o seguinte. Pra você não ficar constrangido, digamos... Di-ga-mos!... Que
eu já tenha alugado pra outra pessoa.
- Quê?! Você já
alugou?!
- Nããão!... Mas
olha só, se eu dissesse pra você que eu não quero mais alugar, o que você ia
pensar?
- Eu ia pensar
que era racismo, né? Óbvio!
- Pois é! Agora,
olha bem pra mim! Você acha que eu sou racista?
- ...
- Claro que não,
cara! Se você quiser, vamo comer uma feijoada qualquer hora, eu tenho vários
amigos negros. Até te mostro a minha coleção de discos do Martinho da Vila!
- Cara, eu nem
gosto de samba!!!... Eu toco
violoncelo!!!!
- Marcelo, você
tá dificultando as coisas. Vamos fazer assim: eu digo que já aluguei, você vai
procurar outro lugar, e continuamos amigos. Tudo bem?
- Como é que é?!
Você quer que eu seja seu amigo?!
- Agora estamos
conversando... Pô, maravilha, cara! Foi um prazer te conhecer, a gente continua
se falando, tá bom? E olha, eu tenho uma mãe-de-santo, que vou te contar...
Pode te ajudar muito a encontrar um apartamento, viu? Vou te recomendar, faço
questão!
- Mas eu sou
ateu!!!!!
- Marcelo,
Marcelo... Você tá dificultando de novo!...
E viveram
felizes para sempre, em plena democracia racial. PNC!
E esses são só alguns exemplos da nossa democracia racial... Você deve conhecer, outros, caro leitor... Infelizmente.
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