A minha rua é geometricamente perfeita. O asfalto é
pouco desgastado. Ao longo dos seus 489 metros, sem sobrar ou faltar, há três
quebra-molas estufados, afastados simetricamente um do outro. As casas têm
portões da mesma idade que os primeiros moradores que, naturalmente, já
descansam em algum cemitério de portões enferrujados. Os telhados, em sua
maioria, estão sutilmente mofados de um verde de tom qualquer, mas algum dia
foram telhas avermelhadas, assim como os lábios das putas que passam em minha
rua, precisamente às 21Hrs, sem sobrar ou faltar. Na esquina, há dois postes
magros de luzes amarelas que iluminam os telhados avermelhados - que agora
ficam alaranjados -, cruzando sombras projetadas pelos sacos de lixos que ali
exalam a decomposição. Voltando à rua, defronte à casa 36, bem no umbigo sujo
da rua, onde moram Dona Graça e suas filhas mães solteiras, há um gato siamês
que mia em busca de uma gata no cio. Quão sujo é esse ato, gato! Sob às luzes
anêmicas, as putas de corpos geometricamente imperfeitos estão na esquina,
forçando o cio, exalando a límpida rotina, mantendo a graça que não aparece nas
sombras. Os seus joelhos enferrujados se estufam, hasteando os ossos
simetricamente desgastados pela falta, falta de luz na carne. Os homens altos e
magros cruzam olhares com a cor de um verde qualquer. Faltam e não sobram
cédulas verdes, cédulas assim não existem mais, mas as putas continuam com o
mesmo valor. Não há gatos siameses, tampouco vira-latas. Não há latas,
entretanto, no asfalto da minha rua há ferrugem nos pequenos pregos que caíram
de alguma cruz. São três putas, são 3Hrs da manhã, os quebra-molas iluminam a
volta das putas que são filhas de alguma cruz. Voltando à minha rua as putas
gritam "chispa" ao gato que gira geometricamente frustrado em círculos,
sem ter achado alguma gata no cio. Tantos bêbados gritaram "chispa",
na frugal tentativa de espantar as 7 prestações de vidas das putas puras. Sem
frustrações, miam alto girando a base de seus batons avermelhados, indo ao
descanso de seus lençóis amarelados pela luz da minha rua que as perseguem com
obstinação. Chispa, putas! A minha lua é geometricamente perfeita e a minha rua
descansa, sem miados, em uma calma oração."
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